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Uma explicação sobre a Realidade Mais Elevada


Introdução ao Svātantryasūtram

(Explicação sobre realidade mais elevada)



Estes dois, o Ser e o Seu Poder - ambos inconcebíveis - constituem a Mais Alta Realidade ||1||


O Ser é o Núcleo de tudo, e Seu Poder tornou-se tudo. Eu chamo o Núcleo de “o Eu” para trazer mais luz em vez de mais escuridão. Se eu o tivesse chamado de “Śiva”, algumas pessoas poderiam considerá-lo como o conhecido Śiva purânico, que é um grande asceta, que vive em uma caverna, cuja principal tarefa é destruir o universo, etc. Outras pessoas podem pensar que, como Viṣṇu é maior que Śiva, aquele deveria ser o Núcleo de tudo e não este, Śiva. Ao mesmo tempo, há também uma tendência de considerar Śiva como impessoal, enquanto Viṣṇu é pessoal. Na verdade, não há fim para o absurdo espiritual, porque não há realmente diferença entre Śiva e Viṣṇu. No entanto, outras pessoas podem sugerir que um nome melhor seria Brahman, etc. Para não cair nessa confusão ignorante de nomes e pontos de vista, optei por atribuir o nome “Ser” ao Núcleo de tudo. No final, quando a iluminação espiritual chega, a mente se retrai (como direi mais tarde noutro aforismo) e, conseqüentemente, não há qualquer um para pensar se “Este Núcleo de tudo” é pessoal, impessoal, Śiva, Viṣṇu, Brahman, etc. O ego apenas entra em colapso e o que permanece é o Eu tal como ele é essencialmente.


Ele e Seu Poder são totalmente inconcebíveis, ou seja, estão além da esfera mental. O Jogo de nomes, pontos de vista e tudo isso é feito pelo Seu Poder, que é sempre tão brincalhão. Em última análise, a pergunta constante é sempre: “Será que alguém é completamente livre como o Ser?” Se a resposta for “Sim”, cumpriu-se o objetivo da vida. E se a resposta for “Não”, então a pessoa deve, de alguma forma, livrar-se da própria escravidão. Esta escritura é, portanto, como um pequeno manual para o seu processo de libertação da escravidão. Não procuro confundi-lo com nomes e pontos de vista filosóficos complexos. Meu objetivo é sempre a sua Libertação e nada mais que a sua Libertação. O Ser e Seu Poder constituem a Realidade Mais Elevada. Depois de alcançá-los, por assim dizer, você estará completamente livre, como Os Dois. O Ser e Seu Poder são “dois” apenas na esfera das palavras, pois na realidade formam uma massa compacta de Liberdade e Bem-aventurança Absoluta. Assim como o Sol pode ser dividido em núcleo do Sol superfície do Sol, coroa, etc, também divido a Realidade Mais Elevada em duas no mundo das palavras para explicá-la a vocês. O próximo aforismo falará sobre esse assunto.



Embora a natureza essencial Deles dois seja uma massa compacta composta de Liberdade Absoluta Bem-aventurança, divide-se-a em dois — apenas na esfera das palavras — para estudo cuidadoso ||2||


O Ser é Liberdade Absoluta, e Seu Poder é Felicidade. Ambos formam uma massa compacta (ou seja, onipresente). Ou seja, a Realidade Mais Elevada é sempre “Uma, sem segundo”, mas, no mundo das palavras, divide-se-a em duas a fim de se estudá-la detalhadamente. Quando essa divisão ocorre, o ato de reconhecer, ou perceber a Realidade Mais Elevada se torna mais fácil. Assim, a própria Realidade Mais Elevada gera essa divisão na esfera das palavras como uma ajuda para que os aspirantes espirituais a se dêem conta dela mais rapidamente.



Embora o Ser seja Consciência pura, consistindo de Prakāśa, ou Luz, Ele é chamado "Eu" na esfera das palavras ||3||


O Ser é Consciência pura, ou seja, o Sujeito Supremo nunca é um objeto. Portanto, Ele não pode ser percebido na forma de “isto” ou “aquilo”. Não pode nem mesmo ser delineado em pensamento de forma alguma. De qualquer forma, no mundo das palavras, Ele é chamado de “eu”, ou também “eu real”, para mostrar que é superior ao falso “eu”, ou ego.



Seu Poder, que constitui a primeira Vibração, é a consciência do Ser, verdadeiramente ||4||


Na natureza imutável do Ser, uma leve tensão é subitamente produzida, na forma de uma vibração sutil. Este é o Seu Poder aparecendo como Autoconsciência, isto é, como Aquilo que torna o “Eu” (o Ser), consciente de Sua própria existência. Tanto o Ser quanto Seu Poder formam, então: “Eu Sou”. Sem o Seu Poder, o Ser não pode saber da Sua própria existência, muito menos da existência do universo. Esta é uma das razões pelas quais direi, no próximo aforismo, que o Eu está sozinho.



Depois dessa primeira Vibração, na forma da consciência do Ser, Seu Poder torna-se triplo ||5||


Seu Poder, após torná-lo consciente de Sua própria existência, divide-se em outros três poderes: Poder de Vontade, Poder de Conhecimento e Poder de Ação.



Depois de ter se tornado triplo, Ele --Seu Poder-- manifesta o universo ||6||


Por meio desses três Poderes, de Vontade, Conhecimento e Ação, o Poder do Ser é capaz de manifestar todo o universo, passo a passo.



Este universo é gerado por Seu Poder, e não pelo próprio Ser diretamente ||7||


É o Seu Poder (a leve tensão no Corpo do Ser imutável) que produz o universo, e não Ele mesmo. Isto é muito importante. Se alguém pudesse perguntar ao Ser sobre a existência do universo e coisas semelhantes, Ele responderia: “De que universo você está falando?”. Ele está sempre sozinho e sem segundo. Ele se torna consciente de Sua própria existência e da existência do universo através do Seu Poder e não de outra forma. Mesmo assim, está sempre no mesmo Estado. Nunca se move nem um milímetro. É por isso que é conhecido como o Núcleo de tudo.



O Poder do Ser permanece como a consciência do Ser, ou na forma do universo, que é uma expansão disso --da consciência do Ser-- ||8||


O Poder do Ser, a leve tensão no imutável Corpo cósmico do Ser, aparece de duas maneiras: como "Eu Sou" (consciência do Eu que tudo permeia; por exemplo, "Eu sou Gabriel", "Eu sou João", "Eu sou Michel", etc) ou como o universo, composto de mentes, corpos, objetos externos, etc. O universo é apenas uma expansão do “Eu Sou”, da mesma forma que “Eu sou Gabriel” é uma expansão do “Eu Sou” em mim mesmo.



O Eu permanece sempre em solidão ||9||


O Ser não tem nada a ver com o que Seu Poder faz. Seu Estado também nunca é perturbado por tudo isso. Ele permanece em absoluta solidão, ou seja, Ele é Aquele sem segundo, a Testemunha imparcial no meio de todos esses pensamentos, objetos, pessoas e assim por diante. Nunca muda, nunca perece, nunca é perdido ou ganho, etc. Sempre permanece o que essencialmente é. O resto dos processos: pensamentos, objetos, pessoas, mudanças, morte, escravidão, libertação, etc, são apenas o resultado do jogo de Seu próprio poder e não “realmente” de Sua própria ação. Sim, não há como descrever tudo isso sem parecer contraditório. Isto ocorre porque as palavras estão sempre no campo da limitação.



A Realidade Mais Elevada, que é uma massa compacta e cuja natureza consiste em Liberdade e Bem-aventurança, nunca é inexistência, isto é, vazio absoluto ||10||


Tanto o Ser como o Seu Poder sempre existem e nunca são inexistentes. Se a Realidade Mais Elevada fosse o vazio absoluto, ninguém a teria percebido em primeiro lugar e, conseqüentemente, ninguém perceberia que ela é a Realidade Mais Elevada. Como sempre há “Alguém” que constantemente percebe a presença da Realidade Mais Elevada (isto é, a própria Realidade Mais Elevada aparecendo como “Eu Sou”), nunca há inexistência, ou seja, vazio absoluto. Este tema é extremamente sutil.



A inexistência desta Realidade Mais Elevada não pode nunca ser provada ||11||


A inexistência do Ser e do Seu Poder nunca poderá ser provada, porque quem a prova “deve existir primeiro”. Se o negador de Sua existência não existe, então como Ele poderia tentar negá-la? E se o negador existe, então existe existência, e não vazio absoluto. Por esta razão, o ateísmo, que aparece na forma de negadores da Realidade Mais Elevada, apenas reafirma a Sua existência. Embora exista algum argumento a favor da existência de um ateu, na forma de alguém que não acredita num “Deus pessoal com características humanas e tudo mais”, ou, alternativamente, que não acredita num “Deus impessoal”, não existe nunca argumento para o aparecimento de um ateu que conceba a Realidade Mais Elevada como um vazio absoluto. Se a Realidade Mais Elevada fosse o vazio absoluto (nada absoluto), pois o próprio ateu não existiria em primeiro lugar. Mesmo que tal pessoa insista em chamar a si mesma de “ateu”, por pura obstinação, ela está apenas provando a existência da Realidade Mais Elevada, através de suas afirmações. Em suma, a inexistência, ou o vazio absoluto, nunca ocorre, e como consequência de tudo isso, nunca pode ser provado. Esta questão foi elucidada detalhadamente pelo sábio Kṣemarāja, ao comentar em seu Spandanirṇaya os aforismos 12-13 dos Spandakārikā-s.



A Realidade Mais Elevada, o Estado Supremo, atua como pano de fundo, substrato de todo o universo e também de sua ausência --da ausência do universo-- ||12||


O Eu e Seu Poder, na forma de “consciência do Eu” (Eu Sou), são o suporte constante de tudo o que existe. Poderíamos pensar neles dois como a terra e a mãe natureza. Enquanto a terra fornece a base para a Vida, a Mãe Natureza a desenvolve. Da mesma forma, o Ser está sempre no mesmo Estado de Liberdade Absoluta. Sobre Ele, o Poder do Ser desenrola o Jogo chamado universo e o chamado ausência do universo. Quando o universo se manifesta, a Realidade Mais Elevada é o substrato, e quando o universo é dissolvido, a Realidade Mais Elevada permanece o substrato dessa dissolução. Então, quando o universo for se manifestar novamente, a Realidade Mais Elevada estará aqui novamente, como a base de tudo o que é manifestado. Este ciclo de aparecimento e desaparecimento do universo continua e continua até que se perceba a Verdade, isto é, até que se alcance a Libertação.



O Estado Supremo é Este que certamente tem um único sabor em todos os seres ||13||


O Estado Supremo, a Realidade Mais Elevada, é sempre experimentado como o mesmo “Eu Sou” por todos os seres. Isso nunca muda nem um pouquinho. É por isso que o aforismo estabelece que o Estado Supremo sempre tem um sabor.



Este Estado Supremo é sempre desobstruído ||14||


Por ser uma massa compacta de Liberdade e Felicidade, ocupa tudo. Por exemplo, durante os vários estados de vigília, sono e sono profundo, o Ser permanece como a Testemunha desses três estados. É uma massa compacta que penetra todos eles. Se não fosse uma massa compacta, não seria detectada a transição de um estado para o seguinte (por exemplo, da vigília para o sono). Além disso, haveria problemas para explicar os processos de memória, pois a cada mudança de estado, esqueceríamos tudo o que foi vivenciado em um estado anterior. Como não é esse o caso, ou seja, como de fato detectam-se transições de um estado para outro e a memória permanece segura, tudo isso indica a presença de “Algo ou Alguém” que não muda entre os estados e é onipresente. Como a Realidade Mais Elevada é assim, ela nunca é obstruída por nada, porque “tudo o que acontece” está sempre acontecendo “nos estados” e nunca “em Si Mesmo”.


Se a Realidade Mais Elevada pudesse ser obstruída por alguma coisa, haveria uma perturbação na existência do universo. Como ninguém jamais experimentou a inexistência total (já que sempre há alguém que existe, mesmo no meio do vazio), está provado que a Realidade Mais Elevada nunca é obstruída por nada. Nunca há aniquilação total da Realidade Mais Elevada, pois sempre há alguém observando como o resto dos seres morre, etc. No final, Este que sempre sobrevive e existe mesmo após a maior aniquilação universal é sempre a Realidade Mais Elevada. Se alguma vez houvesse existido aniquilação total, ninguém existiria agora. Da mesma forma, ninguém conseguiria se lembrar dela. Como todas as aniquilações são sempre lembradas, devia haver “alguém” sobrevivendo sempre. Este alguém, como eu disse anteriormente, é a Realidade Mais Elevada. Desta forma, a ausência de morte total, de inexistência total, de inconsciência total, de “tudo” total é plenamente comprovada, pelo mesmo processo de detecção da presença de “alguém” que percebe constantemente a morte, o vazio, a inconsciência, etc. Sim, pode-se insistir que tudo isto (ou seja, inexistência total, morte total, etc.) é uma “realidade sólida”, mas é apenas mera obstinação “sólida” e nunca algo que possa ser provado por argumentos “sólidos”. A própria existência prova a existência, consciência, eternidade, etc, da Mais Alta Realidade. Conseqüentemente, ela está sempre "desobstruída".



Diz-se que a Mais Alta Realidade é uma "massa compacta" devido à Sua onipresença ||15||


Penetra todos os estados de consciência como sua Testemunha imutável: vigília, sono e sono profundo. A expressão "svasarvavyāpakatvāt" também pode ser traduzida como "porque permeia tudo". Se a Realidade Mais Elevada não fosse imutável e compacta, não seria possível detectar mudanças e transições de estados de consciência. Aquilo que está em constante mudança é apenas uma manifestação do Poder do Ser e nunca da Realidade Mais Elevada como ela é essencialmente.



Não há nada além da Realidade Mais Elevada ||16||


Visto que tudo o que existe é uma expansão do Poder do Ser, nada existe que não seja a Realidade Mais Elevada. Se alguma coisa existe, essa é a manifestação do Seu Poder. E como o Poder do Ser está sempre em unidade com o Ser, no final, tudo o que existe brilha constantemente com a Luz da Realidade Mais Elevada.




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